segunda-feira, 22 de março de 2010

Eu matei uma criança.

Há poucos dias eu tive de encarar um triste, porém irrevogável, fato de minha vida. Eu, hoje com meus 20 anos de idade, matei uma criança. E devo dizer que não foi de uma forma rápida e indolor. Não. Foi da maneira mais cruel e lenta, através de torturas destruindo seus sonhos e convicções, quebrando seu espírito, eliminando sua inocência e ingenuidade. Dando fim a sua capacidade de acreditar no melhor das pessoas.
Foi uma árdua jornada. Foram necessários anos para que isso fosse concretizado. Devo dizer que não sei ao certo quando comecei, mas posso afirmar que tive um êxito fora do comum. Fui destruindo seus sonhos no início. Ordenei que abdicasse de seus prazeres, de realizar suas brincadeiras, de desenhar. Transformei sua vida em frustrações mostrando o quão ruim são as pessoas ao seu redor. Ofusquei o que havia de bom nelas. Tirei-lhe a crença do amor, tornei-a uma pessoa fria e calculista. Aos poucos, fui limando todas as qualidades que a tornavam tão atraente a todos ao seu redor. Solitária, assim ficou. Reflexiva. Hoje em dia, só uma sombra existe. Em tudo que faço, com todos que converso, para todos que me conhecem, só restam lembranças de uma época em que eu era de fato, inocente, ingênuo... Feliz.
Todas as noites, eu a encaro. Ela olha para mim com um olhar triste, decepcionado. E me pergunta se realmente é aquilo que ela se tornará. Se realmente, será apenas uma lembrança de épocas melhores, em que tudo era mais simples, mais fácil, mais gostoso. Não consigo encará-la por muito tempo. Não consigo nem ao menos respondê-la. Sempre que olho para trás, e vejo onde estava, e hoje, onde estou, me lembro de como foi o caminho para matá-la. Para me deixar soberano de mim. Mas com suas sucessivas aparições, ainda me pergunto se realmente, tudo aquilo valeu de algo.
Hoje em dia, minhas felicidades, e satisfações são infinitamente inferiores a época em que mantinha a criança em mim viva. Minha visão do mundo é distorcida e obscurecida, mas quando ainda estava com ela, eu via tudo claramente. Sim, era de fato tudo preto e branco, mas hoje, só enxergo tons cinzas. A minha grande dúvida aqui, não é o porquê de eu tê-la matado, não. Mas sim, até quando esperarei para ressuscitá-la. Vejo-a em tudo que penso em fazer, vejo-a em todos os locais que vou, vejo-a até quando estou dormindo. E sei que o que ela quer nada mais é do que poder respirar novamente, ver o mundo como ele ficou hoje em dia, em comparação com o passado em que ela vivia. A resposta a minha pergunta só eu posso responder, mas a pergunta em si, faço a você também.
Olhe onde está hoje, olhe onde estava há anos atrás, e veja onde queria, naquela época, estar hoje. Não, não quero saber como, por que, ou quando matou sua criança. A minha única dúvida é... Quando você pretende ressuscitá-la?
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Texto revisado por: Cris Mendes